terça-feira, 12 de abril de 2011

E a passagem do trem passou a ser saudade....
















.... E a passagem daquele trem da feira era uma festa.
Um acontecimento social dos mais emblemáticos e importantes
para os que pareciam esquecidos nas bibocas do mundo.
A chegada do trem de passageiro
era uma louvação à inteligência dos homens.

Um raro instante de felicidade
onde se misturavam num só espaço:
Sonhos adolescentes e arroubos de rebeldes meninos

aspirando, quem sabe, conhecer através dos trilhos, outros lugares.
Velhos tempos em que as promessas de progressos
e de outras realizações possíveis
também andavam naquele velho trem cargueiro e de passageiros
rompendo as distâncias das léguas tiranas para chegar enfim,
até todos nós, pobres mortais...

Teimosos sobreviventes dos grotões sertanejos....
Maria-fumaça! Depois o avanço do 'sonho azul'...
Carregado de ilusões e outras novidades
a encher nossos olhos
de brilhos, sorrisos e fumaças.
A chegada do velho trem também era um milagre...
Posto que bastava ouvi-se ao longe o apito estridente da máquina
para que as pessoas das vilas e das provincianas cidades
acorressem todas para as estações.
E ali, uma vez mais, presenciavam deslumbradas
o inacreditável espetáculo-fenômeno
da nossa tecnologia.
Logo, a plataforma de pedra, como num toque de mágica,
de repente se enchia de gente.
Uma algaravia desvairada.
Uma feira de comidas e bebidas logo ali se instalava.

Paqueras, namoricos...

Políticos em seus palanques ao ar-livre.
Parentes que partiam ou quem chegavam.
Abraços... Expressões de tristezas e de contentamento...
O trem trazia consigo no seu longo comboio tudo isso.
Busca de notícias, encomendas,
mercadorias
que se compravam e se vendiam.
Ricos, pobres e miseráveis
tudo o trem levava e também trazia para aquele fim de mundo.
Tudo ali na pedra da velha estação se misturavam
sem maiores conflitos.
E quando enfim, o trem partia novamente
deixava no ar, além de fumaça,
um laivo de tristeza e de saudade,
até o outro dia,
quando todos o esperariam de novo
com o mesmo espírito de entusiasmo e fantasia...
Indefinidamente.
Até que certa feita, alguém se arvorou de dono do mundo.
E com o poder político
trocara os votos dos nossos sertanejos

pelos milhões de dólares dos empresários
dos transportes rodoviários.
Desde então, a passagem daquele velho trem da feira
que sempre foi uma grande festa
passou a ser lembranças.
E de lá pra cá,
antigas cidades, vilas e povoados
espalhados ao longo da linha férrea,
voltaram ao seu quase primitivo estado
desprezo
e abandono.
Tudo o mais agora
é puro silêncio,
solidão e reminsicências.
....
José Cícero/2011
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