domingo, 28 de julho de 2013

Lembro daquilo e não me esqueço*


Ainda me lembro e jamais esqueço
das coisas antigas do meu sertão matuto.
Daquele moleque 'espritado'.
Um ser enxerido e danado
com ar de burrico mandingueiro.
Correndo ligeiro que só fuxico,
porém preguiçoso tal qual jerico.
Bicho do mato mais conhecido
do que arrastar de pinico
e tibungar de caneco na água do pote.
Espirro de tabaco forte,
mormaço de chuva no terreiro.
Cheiro de ovo de capote
estrelado na banha de toicim torrado.
De tudo isso eu me lembro,
nunca me esqueço.
Do som matuto do zabumbeiro.
Do bendito noturno dos penitentes
que me dava medo
durante o terço ao lado do cruzeiro.
Do 'samba' tocado pelo sanfoneiro.
Das brincadeiras dos meninos
no areial do tabuleiro.
Do  ranger melancólico do eixo
do carro de boi antigo
trabalhando na lida do engenho.
Da música estranha dos pifeiros.
Do chiado do jumento mijando
sobre os bagaços.
Do bicho de ferro moendo
como se fosse um monstro comendo
toda a cana doce do baixio.
Lembro ainda hoje
e nunca mais me esqueço
do barulho estridente dos cambitos
sob a cangaia dos burros
açoitados e correndo embrabecidos
sob o açoitar das esporas 
e o estalar do  reio dos cambiteiros
ansiando logo chegar 
ao descanso do domingo.
De tudo isso eu me lembro
e nunca me esqueço.
Do alambique dos mestre Pedro,
do fedor da tiborna nos tanques
e do calor dos tachos
sob o fogo dos roçeiros.
Do cheiro de garapa bem cedo
a correr com os ventos.
adoçando com  mel
e rapadura o amargor da vida
como do mundo inteiro.
Inda me lembro como se fosse hoje,
jamais esqueço.
Das estórias de Lampião e Vicente Finin.
Do raspar do tacho de zinco
e da  gamela de angico
de melado, quebra-queixo, rapadura quente
 e alfinim...
Dos meninos raspando com faca
e chupava os dedos.
Ainda lembro de tudo aquilo
do berro choroso dos bezerros.
Do leite mujido caindo no balde de alumínio,
da água do poço e do brejo
carregada sob a rudia do pote de barro,
o galão e no lombo de jumento.
Do estampido da velha espingarda
caçando nambu e pato.
Do estalar da pedra de seixo
na baladeira dos meninos.
Do cantar matutino dos galos
e de muitos pássaros.
Do namorico e dos escondidos beijos.
Dos sussurros e dos gemidos,
da morena assanhada do brejo
fazendo "aquilo" 
com os cabras do eito,
pras bandas do canavial longínquo
sob as moitas de mari na beira do rio.
E que mesmo escondidos, 
todos os meninos
ficavam logo alucinados.
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Por: José Cícero
In "A Superfície das coisas" inédito-2013.
Aurora - CE.
Foto: www.fotolog.com

sábado, 6 de julho de 2013

POESIA DO DIA A DIA: A Dor que sinto


Sofro e não minto.
E a dor que de fato sinto
é puro tormento. 
Angústia e melancolia
a me consumir  por dentro,
tanto os sonhos
quanto os meus sentimentos.

Sofro tanto
e não nego.
E a dor que carrego
à ferro e fogo no meu íntimo
é sonho incontido
que há muito tenho
junto ao peito.
Além do desejo de ser feliz
por um momento.
Ânsia louca,
de quem nunca se deu por vencido
e tampouco,
por satisfeito.
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Por José Cícero (inédito-2013)
Aurora-CE.